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domingo, 17 de janeiro de 2021

Avolumam-se os e-mails que tem como "Assunto" as agourentas palavras  "Notícia ruim" ou "Notícia triste", invariavelmente, ao menos para mim, enviados pela Leninha, a guardiã da Tchurma. E, lá está a melancólica informação de que algum amigo ou amiga, finou-se. Repetem-se os naturais sentimentos de impotência diante dessa "epidemia" interminável a que chamamos Morte. Seguem-se as costumeiras palavras de condolências dos velhos companheiros de mais de meio século, carregados de maior ou menor emoção, a depender do grau de proximidade com o falecido. Em boa parte das mensagens, nota-se a estupefação diante do desaparecimento do antigo amigo. Ali, mais uma vez, estará um grupo de pessoas, tal como elefantes, a mirar o semelhante abatido por esse predador impiedoso, silencioso, imprevisível, indefensável; a Morte. Anos incontáveis, séculos de perdida memória passaram-se e, em todos eles, infalivelmente, a Morte esteve presente. Entretanto, a repetição desse acontecimento, não tem sido suficiente para que cheguemos a um acordo pacificador da alma; a uma rendiçao incondicional a essa fatalidade e, assim, sempre somos surpreendidos e reagimos como fosse desconhecida e inesperada desgraça.

Há uma popular comparação da vida e morte a uma viagem de trem. Nele, embarcam e desembarcam pessoas nas estações que se sucedem ao longo do infindável percurso. A comparação é boa, e ajuda. Em outra analogia, preferiu-se comparar a vida e morte, a estadia em hotel. Nada do que cerca o hóspede, lhe pertence. A cama onde dorme, a mesa onde se alimenta, a mobília que lhe acomoda, tudo ali será de breve serventia e, haverá um momento em que até mesmo a roupa que veste, terá de ser abandonada. Mas, asseguram os sábios que, a virtude e a honra sobrevivem no espírito. Para isso, nada deve ser deixado para depois. Não temos controle sobre a morte mas, sim, sobre a vida. É preciso encerrar cada dia tendo as dívidas pagas, tal como se espera de uma pessoa honrada e ética, ou, se preferirmos, não se deve desviar o olhar da morte por nenhum um minuto, já que ela, tal como um trem, é a condução para uma existência melhor e eterna e, não devemos perdê-la. Quem espera a morte, nada teme. Entretanto, é necessário não deixar nada inacabado, seja um pedido de perdão ou uma despedida, pois isso tornará mais difícil adentrar ao trem que nos espera na estação para o embarque inadiável. Deve-se partir, deixando todas as contas quitadas, sem necessidade de retornar para acerto de dívidas de nenhuma espécie, de corrigir faltas para com a honra, ou para aprendizado e prática de virtudes básicas. 
Por um momento, a morte pode ser triste mas, em essência, é compreensível e bem-vinda. Por mais suscetível sejamos a dor da separação, a realidade irrefutável é que, revoltar-se contra a morte, não é sensato e, assemelha-se a criança que se recusa a sair do ventre da mãe que o espera para lhe dar amor e carinho. Entrar para o palco onde aprenderá a atuar e, sair aplaudido, e ascender ao panteão dos inesquecíveis e, assim viver eternamente, posto que o esquecimento é, este sim, a segunda e verdadeira morte, tal como ensina o Velho Livro.